Ferramentas e modelos de análise
Os instrumentos analíticos preenchem uma lacuna central no campo da estratégia, o qual, nos últimos anos, desenvolveu um conjunto impressionante de ferramentas e modelos voltados para a concorrência nos oceanos vermelhos, como o modelo das cinco forças, aplicável à análise das condições setoriais vigentes, e as três estratégias genéricas – baixo custo, diferenciação e foco -, mas se manteve quase em silêncio em relação a ferramentas práticas para navegar com excelência nos oceanos azuis.
As ferramentas e modelos aqui apresentados são usados em todo o livro à medida que analisamos os seis princípios da formulação e execução da estratégia do oceano azul. Como breve introdução a essas ferramentas e modelos, examinemos um setor – a indústria vinícola dos Estados Unidos – para ver como aplicar esse instrumental na prática, com vistas à criação de oceanos azuis.
Os vinhos da Califórnia dominam o mercado domestico, respondendo por dois
terços do total de vendas nos Estados Unidos. A produção nacional compete
fortemente com os vinhos importados da Europa e do Novo Mundo.
A competição intensa fomentou a concentração em curso no setor. Os oito maiores vinicultores respondem por mais de 75% da produção americana, enquanto os cerca de 1600 restantes produzem os 25% complementares.
Em síntese, a indústria vinícola americana enfrenta competição intensa, crescente poder de barganha dos distribuidores e varejistas, aumento da pressão sobre os preços e achatamento da demanda, não obstante a variedade de oferta cada vez mais ampla.
Para o estrategista, a questão crítica é: Como escapar desse oceano vermelho de competição sangrenta e tornar os concorrentes irrelevantes? Como desbravar e explorar o oceano azul do espaço de mercado inexplorado?
A matriz de avaliação de valor
A matriz de avaliação de valor é tanto um instrumento de diagnóstico como um
modelo para o desenvolvimento de uma estratégia consistente de oceano azul. Dois são os seus propósitos. Primeiro, captar a situação atual no espaço de mercado conhecido; e o que os compradores recebem como clientes de qualquer das ofertas competitivas existentes no mercado.
No casa da indústria vinícola americana, sete são os principais atributos:
- Preço por garrafa de vinho;
- Imagem de nobreza e refinamento na embalagem;
- Fortes investimentos em marketing para capturar a atenção do consumidor;
-- A qualidade de envelhecimento do vinho;
- O prestígio e o legado do vinhedo;
- A complexidade e a sofisticação do sabor do vinho;
- O espectro diversificado de vinhos.
A Figura 2.1 mostra que, embora mais de 1600 vinicultores participem da indústria vinícola dos Estados Unidos, suas curvas de valor, sob o ponto de vista do comprador, apresentam enorme convergência.
Para posicionar uma empresa em uma trajetória crescente e lucrativa dadas essas condições setoriais, imitar os concorrentes e tentar superá-los, oferecendo um pouco mais por um pouco menos, não produzirá resultados. É até possível que as vendas subam, mas dificilmente levará a empresa a desbravar novo espaço de mercado inexplorado.
Com o propósito de mudar fundamentalmente a matriz de avaliação de valor do setor, a empresa deve começar com a reorientação de seu foco estratégico, de
concorrentes para setores alternativos, e de clientes para não-clientes do setor.
No caso de indústria vinícola americana, a sabedoria convencional levou os
vinicultores a manter o foco na superação dos concorrentes considerando os
atributos de prestígio e qualidade do vinho e mantendo o mesmo patamar de preço.
No entanto, ao prospectar as alternativas, a Casella Wines, vinicultora australiana, redefiniu o problema da indústria vinícola nos seguintes termos: “Como produzir um vinho agradável e irreverente, que seja fácil de beber para todos”. A Casella Wines descobriu que a massa dos americanos adultos via o vinho com desinteresse.
Consideravam-no intimidante, pretensioso e com um sabor cuja complexidade
representava um desafio para a maioria das pessoas.
O modelo das quatro ações
A fim de reconstruir os elementos de valor para o comprador, na elaboração de uma nova curva de valor, desenvolvemos o modelo das quatro ações, como mostra Figura 2.2.
Uma nova curva de valor
A primeira pergunta força a empresa a considerar a eliminação de atributos de valor que há muito tempo servem de base para a concorrência no setor.
A segunda pergunta força a empresa a examinar se existe excesso nos atributos dos produtos e serviços oferecidos. No esforço de imitar e superar a concorrência.
A terceira pergunta leva a empresa a identificar e a corrigir as limitações que o setor impõe aos clientes. A quarta pergunta ajuda a empresa a descobrir fontes
inteiramente novas de valor para os compradores, buscando criar novas demandas e mudar a estratégia de preços do setor.
O resultado da aplicação do modelo das quatro ações à matriz de avaliação de valor do setor é a descoberta de novos aspectos na leitura de velhas verdades não questionadas.
No caso da indústria vinícola americana, ao aplicar essas quatro
ações à lógica vigente e ao examinar as alternativas e os não-clientes, a Casella Wines criou o (yellow tail), um vinho cujo perfil estratégico desgarrou-se da concorrência e desbravou um oceano azul.
A Casella criou uma bebida social acessível a todos: apreciadores de cervejas, de coquetéis e de outras bebidas. Em dois anos, o (yellow tail), despontou como a marca de mais rápido crescimento na história da indústria vinícola australiana e americana.
A Figura 2.3 mostra a extensão da aplicação do modelo das quatro ações no
rompimento da concorrência na indústria vinícola americana. Aqui podemos
comparar de forma gráfica a estratégia do oceano azul do (yellow tail) com o
desempenho de mais de 1600 vinicultores que concorrem nos Estados Unidos.
Ao oferecer esse sabor adocicado de frutas, o (yellow tail) reduziu drasticamente ou eliminou outros atributos de valor com base nos quais a indústria vinicola competira durante tantos anos – tanino, carvalho, complexidade e envelhecimento – na fabricação de vinhos finos, seja no segmento de vinhos Premium, seja no segmentode vinhos populares.
O (yellow tail) mudou tudo isso, ao criar facilidade de escolha. Para tanto, reduziu drasticamente a variedade de vinhos oferecidos, produzindo apensa duas: Chardonnay e Shiraz.
Aos simplificar a oferta, de início, para apenas dois vinhos – um tinto e um branco – a Casella Wines agilizou o modelo de negócios. A redução dos volumes maximizou o giro e minimizou os investimentos em estoques.
A matriz eliminar-reduzir-elevar-criar
A matriz induz as empresas a não só responder às quatro perguntas do modelo das quatro ações, mas também a agir com base nelas, para construir uma nova curva de valor.
A Figura 2.5, a matriz eliminar-reduzir-elevar-criar referente ao Cirque du Soleil,
fornece outro retrato dessa ferramenta em ação e apresenta suas revelações. A constatação mais importante é a variedade de atributos que há muito tempo são a base da competição setorial e que, conforme se conclui, podem ser eliminados ou reduzidos.
Figura 2.5
Matriz eliminar-reduzir-elevar-criar: Caso do Cirque du Soleil
Eliminar Elevar
Três características da boa estratégia
O (yellow tail), assim como Cirque du Soleil, criaram uma curva de valor única e excepcional, para desbrvar seus oceanos azuis. Como se constata, na matriz de avaliação de valor, a curva de valor do (yellow tail) se caracteriza pelo foco; a empresa não dispersa seus esforços entre todos os atributos de valor.
Quando expressa na forma de uma curva de valor, uma estratégia do oceano azul eficaz como a do (yellow tail) apresenta três qualidades complementares: foco, singularidade e mensagem consistente.
No perfil estratégico da Southwest Airlines para se constatar como essas três
qualidades são básicas na eficácia da estratégia em reinventar o setor de aviação comercial de vôos curtos por meio da inovação de valor (ver Figura 2.6). A Southwest Airlines criou um oceano azul ao romper os trade-offs que os clientes eram obrigados a exercer entre a velocidade dos aviões, de um lado, e a economia e flexibilidade do transporte em automóvel, de outro.
FIGURA 2.6
Foco
Toda estratégia notável tem foco, e o perfil estratégico da empresa, ou sua curva de valor, deve mostrar isto com nitidez.
Singularidade
Quando a estratégia é formulada de forma reativa, como tentativa da empresa
acompanhar a concorrência, ela perde sua singularidade.
Mensagem consistente
A boa estratégia tem uma mensagem consistente e convincente. Uma boa
mensagem não só deve ser clara, mas também anunciar uma oferta verdadeira, para que os clientes não percam a confiança e o interesse. Com efeito, uma boa maneira de testar a eficácia e a força de uma estratégia é verificar se ela possibilita a criação de um slogan vigoroso e autêntico.
Como mostra a Figura 2.7, o perfil estratégico do Cirque du Soleil também satisfaz as três qualidades que definem a estratégia do oceano azul: foco, singularidade e mensagem consistente. A matriz de avaliação de valor do Cirque du Soleil permite a comparação gráfica de sua curva de valor com a dos principais concorrentes.
Figura 2.7(yellow tail), Cirque du Soleil e Southwest airlines criaram oceanos azuis em ambientes de negócios e em contextos setoriais muito diferentes. Contudo, os perfis estratégicos tinham em comum as mesmas três qualidades: foco, singularidade e mensagem consistente. Esses três critérios orientam as empresas em seu processo de reconstrução, a fim de revolucionar a criação de valor, tanto para os compradores quanto para si próprias.
Leitura das curvas de valor
A matriz de avaliação de valor cria condições para que as empresas vejam o futuro no presente. Para tanto, as empresas devem aprender a ler as curvas de valor.
Estratégia do oceano azul
A primeira pergunta respondida pelas curvas de valor é se o negocio realmente tem condições de ser vencedor. Quando a curva de valor da empresa, ou a de seus concorrentes, atende às três qualidades que definem uma boa estratégia do oceano azul – foco, singularidade e mensagem consistente ao mercado.
Empresa à deriva no oceano vermelho
Quando a curva de valor de uma empresa se confunde com as dos concorrentes, isso significa que ela se perdeu no oceano vermelho da competição sangrenta.
Excesso de atributos sem retorno
Quando a curva de valor na matriz de avaliação de valor mostra que os níveis de oferta da empresa são altos em todos os atributos, a pergunta cabível é: Será que a fatia de mercado e a rentabilidade são compatíveis com esses investimentos? Se a resposta for negativa, a matriz talvez esteja sinalizando que a empresa pode estar oferecendo demais aos clientes.
Estratégia incoerente
A curva de valor que parece um prato de espaguete – um ziguezague sem rima e ritmo, no qual as ofertas traçam um emaranhado de “altas e baixas, altas e baixas, altas e baixas” – sinaliza que a empresa não tem uma estratégia coerente, mas, ao contrário, um conjunto de subestratégias independentes.
Contradições estratégicas
Será que existem contradições estratégicas? Esses são os casos em que a empresa oferece altos níveis de atributos de valor, ao mesmo tempo em que ignora outros que atuam como fontes de apoio e sustentação.
Empresa com foco interno
Ao desenhar a matriz de avaliação de valor, de que maneira a empresa rotula os atributos de valor do setor? Por exemplo, usa a palavra megahertz em vez de velocidade, ou temperatura de fontes termais em vez de águas quentes? Os
atributos de valor estão expressos em termos que os compradores possam
compreender e valorizar ou estão articulados na forma de jargão operacional? O tipo de linguagem usada na matriz de avaliação de valor reflete se a visão estratégica da empresa resulta de uma perspectiva “de fora para dentro”, orientada ao mercado, ou de uma perspectiva “de dentro para fora”, movida pelas operações internas.
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